domingo, 26 de outubro de 2008

Uma jovem diferente



Surpreendente. Essa é uma das poucas palavras que consigo proferir após encontrar com essa jovem, tão humana e diferente que é Tayana. Filha de José Luiz Dantas um dos maiores empresários brasileiros, essa menina, se é que é possível chama-lá de menina é sem duvida uma das mais geniais figuras que já conheci.
Já havia lido seus textos, já havia visto sua presença magnífica nos palcos, e já tinha ouvido muitas historias a seu respeito, mas estar ali frente a frente com ela foi sem palavras.
Quando cheguei a seu apartamento que tem cores predominantemente claras sentei-me no sofá para aguarda-lá enquanto observava a sua Marilyn Monroe(Um quadro enorme da atriz toma conta da parede central de sua sala.), enquanto ela não vinha, imaginava alguém, de voz forte e jeito desconfortante.
Eis que ela surge, de cabelo ainda molhado, vestido e chinelo, me abriu um sorriso que afastou qual quer distancia. Então se sentou ali do meu lado, me ofereceu algo, e ao meu negar, ficou ali me olhando, meio tímida, doce, com um ar inocente, pequeninha.
Fiquei sem reação, pois após vê-lá assim, tão humana, tão menina me senti desmontada, esperava falar com algo parecido com o menino-prodígio sei lá, mas ela era só menina, normal.
Para quem não sabe, Tayana Dantas, ou Tay, como é conhecida, é a mais premiada atriz capixaba, além de ser produtora cultural, roteirista e surfista nas horas vagas. Ela já recebeu prêmio de melhor atriz nos festivais nacionais de BH, Vitória e RJ, atualmente, um pouco afastada dos palcos tem se dedicado por inteiro ao cinema, onde atua como atriz e produtora.
A queridinha do Gob, a musa da Lubiana, a estrela Dalva da Maura Moschen, Tayana deixou o Espirito Santo em busca de mais conhecimento para aprimorar seu trabalho artístico e atualmente vive no Rio de Janeiro, mas sempre que pode dá as caras na terrinha, seja por trabalho ou lazer.
AR- Tayana aos 13 anos de idade seus poemas já ganhavam repercussão nacional, ao que se deve essa intelectualidade precoce?
Intelectualidade? (Ela ri). Cara eu não sou intelectual. Eu sempre fiz analise, desde uns 09 anos, mas sempre fui tímida, não conseguia falar, ai eu escrevia o que passava pela minha cabeça para a minha terapeuta, para que ela pudesse me entender...Ela me pediu para publica-lós e eu autorizei, mas eram só pensamentos de uma criança de imaginação fértil. Pra você ter idéia eu era muito bobinha, acreditava em Peter Pan aos 13 anos, aos 11 eu fiz meus primos passarem quase um verão inteiro dentro de casa escrevendo historias sobre ele, tinha fixação nessa lenda do menino que não crescia...Na verdade eu tenho até hoje.
AR- Mas você cresceu de pressa né? É cheia de responsabilidades...
Você acha? Minha mãe vive dizendo que tenho que ter mais responsabilidade com as coisas. Sou mega viajante, vivo perdendo minhas coisas.
AR- Mas você tem só 19 anos, é produtora, roterista, atriz... A maioria das meninas da sua idade e do seu ciclo social estão apenas na faculdade.
Eu não sou nada ainda, pretendo ser um dia e isso não é modéstia não, eu realmente não sou nada Eu amo cinema, teatro, música, artes em geral, pra mim é tudo uma brincadeira, sou feliz demais quando estou próxima disso tudo, por isso que digo que não cresci, quando eu trabalho é como se estivesse fazendo o mesmo que fiz com meus primos naquele verão.
AR- Seu pai é um dos maiores empresários brasileiros, e é dono da maior universidade capixaba. Porque escolher uma profissão tão distante da dele?
"Poutz", meu pai sempre fala isso, que tem uma universidade com quase todos os cursos e eu fui escolher logo o que ele não oferece. Bom sei lá, eu sempre amei arte, sempre gostei de atuar. Mas vou ser bem sincera, não sei se teria tanta fome por ela se meus pais não tivessem sido contra. Sabe, eu sempre tive uma coisa, uma angustia sei lá e por isso eu fazia terapia, eu falava pra minha mãe desde sempre, que me sentia estranha, como se eu não fizesse parte desse mundo, era uma sensação estranha, que as vezes ainda me acomete, uma sensação de não pertencer que a Clarice Lispector descreve bem. Eu não me sentia pertencente. Quando me descobri atriz, vi que essa vocação não agradava ninguém que compartilhava daquele mundo que eu fui inserida. Ninguem entendia, ninguem aprovava aquela profissão, aquele meu querer, foi ai que passei a leva-lo a serio, pois me sentia exatamente como eles descreviam esse oficio, marginalizada, então, eu pensei que talvez me senti-se pertencente a aquele mundo.
AR- E se sente?
Ás vezes.
AR- Você tem um modo de interpretar bastante peculiar, isso já lhe rendeu diversos prêmios, qual é o seu método?
Eu ainda vou ter um... Meu trabalho é intuitivo, é pautado no outro. Gosto de ficar ali aberta ao momento. Ás vezes eu não tenho a menor noção do que vai acontecer na cena, e isso é assustador, é o que me impulsiona. Eu gosto de viver a situação, eu gosto de abrir-me para uma nova escolha de mim mesma e deixar ela fluir sozinha, de estar inteira ali...Mas nem sempre o outro te quer né? É assim na vida e também na cena, e é por isso que estudo, para possuir uma técnica. Atualmente a única coisa que faço é me doar.
AR- Como você se imagina daqui há dez anos?
Me imagino uma puta atriz, fazendo muito cinema, eu quero ser uma diva, é o meu lado fútil, escapei de ser socialite em Vitória, mas eu quero ser uma atriz do caramba e fazer muito sucesso...Morro de medo de morrer, de ser esquecida, sou egocêntrica as vezes.
AR- E seus projetos futuros, quais são?
Caramba...Tenho muitos, mas aprendi que para eles se realizarem a gente não deve contar...Sabe como é esse lance de mau olhado né? Eu comecei a acreditar que isso existe mesmo.
AR- E os presentes?
Estou filmando o filme do Cae. Farei Rita a protagonista do curta da Lu(Luiza Lubiana), uma jovem italiana que se apaixona por um cigano. O curta do Bigode e estou na coordenação nacional do festivais de cinema da petró.
Vamos para nossas rapidinha?
01. Qual é sua palavra favorita?
Agora02. Qual é a palavra que você menos gosta?Não03. O que te anima?Atuar04. O que te desanima?Grosseria05. Qual é o seu palavrão favorito?Vai tomar no cú06. Que som ou barulho você adora?Risada de criança07. Que som ou barulho você odeia?Turbinas de avião08. Que profissão, excetuando-se a sua, você gostaria de ter?Psicologia 09. Que profissão você não gostaria de ter?Coveira10. Se o Céu existir, o que você gostaria que Deus dissesse a você assim que chegasse aos Portões Celestiais?Pode entrar.

AR- Quem é você?
Uma escolha diária. Uma grande confusão.
AR- Ídolos
Meu pai, Angelina Jolie e Paula Lavigne.
AR- O maior amor do mundo
Minha mãe e minha arte.
AR- Uma dor
A minha.
AR- Um medo
De avião e de morrer, se é que têm alguma diferença.
Durante cinco dias, filmes desde a década de 20 até os anos 00 se apossaram da tela da famosa sala azul. Na cadeira ao lado, Ursula Dart (foto), diretora da Associação Brasileira de Documentarista Capixaba (ABD&C) que organizou a mostra. Ainda entusiasmada com a mostra e sempre sorrindo, Ursula faz uma avaliação da mostra e conta sobre os critérios de seleção dos trabalhos exibidos. A primeira pergunta é básica: como você avalia a Mostra A Vida é Curta, agora que já se passou quase uma semana e a poeira já assentou?A organização você sabe que é da ABD (Associação Brasileira de Documentaristas). Na realidade, somos cinco pessoas trabalhando. Considero que a mostra foi muito bem. Estou muito contente, acho que deu tudo certo. É claro que houve erro tanto de programação, os debates poderiam ter sido mais bem trabalhados, mas, no geral, acho que foi tudo ótimo. Quanto à organização, tudo ótimo. Essa é a terceira mostra, o que essa teve de melhor em relação às outras duas?

Foto: Syã Fonseca

Ela foi mais completa que as outras. Porque as outras foram apenas mostras. Competitivas ou não, mas mostras. Essa, além de ser mostra, a gente fez duas, pois considero a Obras Raras sendo uma outra mostra. E cada mostra abriu um braço. A de obras raras abriu o para o catálogo e a competitiva abriu para a coletânea de DVDs. Então, foram quatro ações e considero essa mostra a mais completa nesse sentido. E foi essa coisa do A Vida é Curta. A gente foi atrás da nossa história até hoje e fizemos esse resumo, uma tentativa de resumo da cinematografia do estado, que está perdida. Mas não só aqui não, é no Brasil mesmo.Como foi o trabalho de pesquisa e levantamento de dados para a elaboração do catálogo?A idéia inicial dele era abranger tanto os trabalhos realizados em película quanto em vídeo, mas não tivemos perna para isso - são muitos os trabalhos em vídeo. Ficamos só com os em película. A Carla Osório foi quem organizou tanto os textos quanto a pesquisa. As fontes foram catálogos e os próprios realizadores. Outra fonte também foram as cinematecas de museus. Você citou que problema na programação. Quais os critérios que vocês usam para selecionar os filmes, principalmente da mostra competitiva?Olha, vou ser sincera. A idéia da ABD, desde a primeira mostra, é abrir a exibição para os filmes locais, filmes realizados aqui. Porque a questão da exibição é um problema de qualquer filme, de qualquer estado, de qualquer realizador. Então, a gente trabalhou com a grade de programação. A gente tinha "tantas" horas e ali dentro a gente tentou colocar o maior número de filmes possível. Muitos filmes entraram. Talvez se fosse uma seleção mais rigorosa, talvez não entrassem. Mas apostamos na exibição, senão vai haver uma dificuldade de se exibir em outro local e não é porque é ruim ou bom, não. É porque a exibição é difícil mesmo, é um funil. A idéia é abrir. O critério foi esse. É claro que os primeiros a serem "cortados", foi quando um realizador inscrevia cinco filmes. Selecionamos o melhor para abrir para o outro que colocou um filme só. A programação diária também foi balanceada. Tínhamos filmes em 35 mm e documentários que distribuíamos com outros com perfil mais universitário e experimental. Mas aí não acaba tendo uma certa discrepância, quando se põe pessoas com perfil universitário com pessoas que são profissionais há muitos tempo... Mas é também interessante para mostrar "olha o que a gente está fazendo"; o que o estado, a universidade estão fazendo. Por isso, essa briga da ABD de exibir o maior número de filmes possível. E com certeza vai cair nessa discrepância, que é saudável.Pois é, pediram para eu ser cordial, mas como é competitiva fica meio que uma covardia colocar uma Virginia Jorge contra alguém que está no primeiro período de comunicação que fez um videozinho com a cybershot...

Foto: Syã Fonseca

Cara, eu não vejo muito por aí. Inclusive no júri, nós tivemos uma conversa que era muito dentro disso. Vamos nos novos, nas novas propostas. Não se é Virginia [Jorge, diretora do premiadíssimo curta No Princípio Era o Verbo, de 2005] ou outro mais veterano. Mas é um espaço democrático e entra todo mundo. Não vou tirar o cara porque tem Virginia e nem vou tirar Virginia porque tem o cara. Como também não vou abrir só para 35mm e nem só universitário. A proposta dessa mostra foi isso. Ainda mais com o título "A Vida é Curta". Vamos colocar tudo que tem na roda. Por mim colocava mais ainda, mais diferentes ainda. A idéia é democratizar realmente. Para finalizar, a ABD já está planejando a próxima mostra? É igual carnaval quando termina e a escola já está pensando no próximo enredo?Menino, é um doideira. Pior que é assim mesmo (ri). A gente termina e fica pensando: "podíamos fazer 'isso', porque a gente vai aprendendo com os erros". É sempre uma tentativa de melhor. Mas a gente ainda não fechou o que pode ser. Vamos correr atrás do projeto e manter as parcerias. Mas ano que vem, tem campanha e a gente não sabe se serão mantidas. Enfim, ainda não fechamos nada.

Erly Vieira Jr.

Tema CINEMA, GRINALDAS E IMPROVISAÇÕES: UM OLHAR SOBRE A OBRA DO CINEASTA ERLY VIEIRA JUNIOR. O Cineasta Erly Vieira Junior, foi o primeiro capixaba a editar em DVD seu trabalho. Lançado no último dia 30/07, com recursos da Lei Chico Prego, no Cine Metrópolis, “Algumas estórias” reúne quatro Curtas: “Macabéia” (2000), “Pour Elise” (2004), “Saudosa” (2005) e “Grinalda” (2006). O resultado final é primoroso. Comprei o DVD na Flash Vídeo de Vila Velha, e é realmente inovador e inspirador, tem uma linguagem intertextual e faz muitas vezes você se sentir como co-autor da história, o que para o cinema e a literatura é fundamental. E é isso que faz o trabalho de Erly ser maravilhoso e instigante. Ele te convida a participar das histórias. Algo muda dentro de você ao assistir, por exemplo, ao curta “Saudosa”, você fica pensando: “será verdade? Terá existido essa mulher?”. São essas perguntas interiores e subjetivas, que servem de termômetro para avaliar quem é artista realmente, e quem está de passagem, e digo: Erly é realmente um artista e tem muito mais a acrescentar ao nosso restrito circuito cinematográfico. Entrevista com Erly Vieira Junior – Cineasta e escritor, feita em 03/10/2008.
1 – Como foi a descoberta da literatura e do cinema na sua vida? Erly: Começa com uma vontade de escrever – que acho todo mundo tem no final da adolescência, mas antes me percebi como espectador e leitor. Quando entrei na Ufes, peguei uma daquelas greves de três meses, tinha muito tempo livre, então fiquei sócio da biblioteca da FAFI. Li muita coisa de Borges (Jorge Luis Borges), Cortázar (Julio Cortázar) e Calvino, lia uns dois livros por dia, e me perguntava: então literatura pode ser isso? E ainda me sobrava tempo para ver filmes. Daí descobri o Metrópolis e outras linguagens de cinema, que eu não estava acostumado, e fiquei impressionado, e me perguntando também: então cinema pode ser isso? Assisti ainda a Mostras que aconteciam na FAFI, de cinema francês, alemão e japonês, que foram importantes pra mim. A oficina que fiz com Valdo Motta, que freqüentei como ouvinte, ali acho que nasci como escritor, e daí surgiu a primeira publicação que foi uma coletânea com patrocínio da Prefeitura de Vitória, também juntamos um pessoal e fazíamos recitais. E da mesma forma que da vontade de ler veio a vontade de escrever, da vontade de ver filmes veio a vontade de trabalhar com filmes. Em 1997, participei de um curso que o Governo do Estado fez de realização cinematográfica, e o trabalho final era um curta em 16mm. Esse curso serviu pra juntar um monte de gente interessada em fazer cinema. Em 1998, o Vitória Cine Vídeo abriu um concurso de roteiro e eu o ganhei, e o pessoal que havia feito o curso comigo trabalhou junto novamente no Macabéia. 2 - Como surgiu o roteiro de Macabéia? Erly: Na angústia de escrever o roteiro, lá estava eu subindo a ladeira da casa da minha mãe – em Maruípe, quando inesperadamente uma Kombi veio na minha direção, e a primeira reação foi me jogar no primeiro muro chapiscado – eu tinha ganho uma fitinha do senhor do Bomfim e supersticioso que sou – quando sai do muro a fitinha caiu, e ao invés de pensar “acabei de escapar de um atropelamento”, pensei: “onde encontrar água corrente para jogar e completar a simpatia e o meu desejo se realizar, daí pensei: “to parecendo a Macabéa da Clarice”, e veio o insight. Comecei a pensar em como seriam as macabéas de hoje? Pensei em vitória final dos anos 90: elas provavelmente teriam 2º grau, saberiam informática, estudariam inglês, tipo aqueles cursinhos da globo, e teriam sonho de trabalhar no shopping. Juntamos uma turma, mas não tínhamos dinheiro, então entramos na Rubem Braga da Prefeitura de Vitória. No grupo de trabalho contamos com a co-direção de Lizandro Nunes e Virgínia Jorge. Quanto à escolha da atriz, Janine Corrêa foi surpreendente: estávamos testando algumas candidatas, e tivemos que fazer uma pausa de dois meses para a Virgínia rodar o vídeo “De amor e bactérias”, em 1999. Quando retomamos o trabalho, estávamos em dúvida entre três candidatas. Janine era a única que manteve a personagem do jeitinho que havíamos deixado ao final da primeira série de laboratórios. Ou melhor, ela não só manteve o tom da personagem, como também o aprimorou. Com um detalhe: ela sequer pode ensaiar em casa durante todo esse tempo, uma vez que o roteiro havia sido esquecido na casa de Virgínia. Depois dessa prova excepcional de talento e potencial, não tivemos mais nenhuma dúvida: ela foi escolhida na hora. Rodamos em 1999, todo mundo trabalhou de graça, pois a verba do concurso ainda não tinha saído, estreamos em 2000. 3 – E como foi o processo até chegar no curta Pour Elise? Erly: De Macabéa até Pour Elise, pensei qual tipo de filme que quero fazer. Em Pour Elise, a vontade era a de experimentar – queria “errar” tudo ali. O projeto foi aprovado em 2002, mas só pude rodar em 2004, então tive uma rejeição a história – pelo tempo longo que passou da idéia inicial até a realização, eu queria mudar tudo, mas tinha o compromisso ético de rodar o roteiro que havia sido aprovado na Rubem Braga. Decidi então trazer esse meu conflito pessoal para o roteiro, de maneira metalingüística, como se fosse um filme sobre uma história que pede para ser contada de forma diferente (daí os personagens dos velhinhos, que se tornam co-roteiristas no meio do filme). Não foi tão bem recebido quanto Macabéa, mas começava ali uma história. 4 – E o curta Saudosa? Pessoalmente achei surpreendente, realmente acreditei ter existido aquela mulher, como foi esse processo de documentário-ficção? Erly: Um filme de ficção disfarçado de documentário, filmamos em Muniz Freire em 2005, em vídeo digital, na improvisação, a gente não dava o texto, a gente convidava os moradores a “mentirem”, e aí já entra a metalinguagem e o improviso, sempre com muito humor. Rodamos em Setembro e antes de outubro já estava editado. Estreou no Vitória Cine Vídeo no mês seguinte (inscrevemos no último dia do prazo de inscrição). Em Saudosa eu estava sentindo a mesma liberdade quanto eu pegava a caneta e escrevia literatura. 5 – O curta Grinalda, foi o que mais gostei, como foi trabalhar aquela improvisação maravilhosamente bem interpretada pela Letícia? Erly: Sempre fui muito próximo de Letícia, eu dizia: “o dia em que eu fizer um longa, trabalho com você”, mas como esse dia ainda não chegou, resolvemos fazer o curta primeiro. E ela vem do Teatro de Rua, já existe essa coisa da improvisação. E aconteceu assim: eu dava situações e ia provocando, na hora da edição eu fui retirando minhas intervenções. Misturamos realidade e ficção, eu já tinha uma idéia que era uma mulher falando de seus ex-maridos, num lugar fictício. Mas tem situações reais também, como o motoqueiro que acharam o corpo e ela (Letícia) no caixa eletrônico – explico: minha mãe recebeu um trote telefônico e a pessoa dizia que eu tinha sido atropelado na Reta da Penha, mas ela sabia que eu estava no Rio. Como esse havia sido o assunto do café da manhã, pouco antes de sairmos para gravar, Letícia acabou criando um monólogo sobre um ex que havia passado pela mesma situação, então coloquei isso no filme. As cenas no cemitério, na lápide foram inspiradas nos trabalhos de Tatiana Sobreira (um conjunto de três telas, com as inscrições “Diabo não existe”, “Meu inferno sou eu”, “Meu mau é todo meu”) e a cenas dos saquinho de chá também me inspirei em outra artista, a Elisa Queiroz, que eram imagens de pessoas nos saquinhos de chá, pedi autorização, e mesmo aí há uma realidade, porque a Letícia (atriz) tem essa formalidade de receber, sabe? Põe mesa para café, tira a louça toda do armário, essas formalidades. 6 – E quais as novidades que vem por aí? Já Existem coisas pensadas, ou vai depender de inspirações futuras? Erly: Com Letícia temos dois curtas realizados depois do DVD: “Eu que nem sei falar francês”, foi um dos vencedores da IV Mostra Produção Independente - Desconstrução, realizada em Junho pela ABD – Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-Metragistas, no Cine Metrópolis, e está no You Tube. Continuamos com a linguagem da improvisação, ela aparece com a imagem refletida na tela da tv, assistindo a uma apresentação do cantor francês Charles Aznavour, desta vez sem cortes, num único plano-seqüência, eu vou provocando Letícia, escondido além do alcance da câmera, mostro objetos escolhidos aleatoriamente e ela vai improvisando. O texto, mais uma vez, tem um caráter de comédia. O outro curta, ainda a estrear, é “Avenca”, também com Letícia. Fala sobre solidão, o dia a dia de uma mulher que mora sozinha, sem diálogos. Nesses dois trabalhos, continuo utilizando a metalinguagem e a intertextualidade. São dois trabalhos rodados com recursos próprios, sendo que o “Avenca” será finalizado em 35 mm, com o patrocínio do Edital de Finalização de Curtas da Secult-ES.

Virginia Jorge

Entre 2005 e 2007 um curta-metragem capixaba saiu arrebatando platéias pelo Brasil, até chegar no exterior. “No Princípio Era o Verbo”, uma história composta de outras três, foi projetada nas telas e acabou projetando a roteirista e diretora Virgínia Jorge. Da cineasta em questão, um amigo já disse: ‘você é a mais mexicana das britânicas’. Parece que a mistura na personalidade deu certo. E foi profícua para a arte.
Era uma tarde quente de março, dessas que fazem famoso o verão brasileiro. Num dos pontos da cidade de Vitória chamado Ilha das Caieiras, o verão parecia não transcorrer em sua normalidade de carnaval, férias, praia, turistas… Pelo menos durante uma semana, quem morava ou passava por ali pôde ver um dos bares da região ter a porta e todas as outras entradas de ar e luz cobertas por pano preto. Lá de dentro, o código do segredo vinha gritado: Silêncio! Ação! Corta! Também se ouviam risadas.
Algo se desvendava.
O que não podia ser desvendado é que, além do sol, do pano preto e do calor humano de aproximadamente 20 pessoas, o ambiente também era aquecido com alguns mil watts de luz, formando uma caixa isolada do mundo, onde, facilmente, um termômetro marcaria 50°. Também não se podia adivinhar que dentro daquela caixa quente, sob outra ainda menor, feita de papelão, um menino se ajoelhava, colava o ouvido no chão e escutava o que os chineses falavam do outro lado do mundo.
Coisa de cinema!Certamente era.
Essa foi uma das cenas do filme “No Princípio Era o Verbo” de Virgínia Jorge, produção que projetou para o Brasil e para o exterior, o talento dessa capixaba procedente de Brasília. Mas essa história começa bem antes, em tardes talvez não tão quentes como aquelas, mas tão criativas quanto.
Desliguem os celulares, o filme vai começar. Pra vocês, Virgínia Jorge Silva Rodrigues, editada.
Para usar a linguagem de cinema, em plano aberto, ela diz não se lembrar de grandes acontecimentos na infância, ao menos os que possam parecer grandes numa tela de cinema, mas, fechando o quadro, lembra até hoje do cheiro do lápis de aquarela usado pela artista plástica de quem, do nome, ela não recorda. Lembra também que tinha uma ceramista alemã, a Mônica (Von Gliski) e um pintor famoso de nome Loio Pérsio (um dos precursores do abstracionismo informal na arte brasileira, falecido há alguns anos) desenhando seu pai.
Isso tudo acontecia em Manguinhos no início dos anos 80, quando o balneário, uma vila de pescadores, ficou famoso por abrigar artistas e intelectuais. Celsão e Claudia, pais de Virgínia, estavam entre eles. Vieram de Brasília e estavam morando lá. A menina, naturalmente, participava e observava a cena e seus atores. “Essas são as minhas lembranças de infância, de ficar jogando pedrinha no mar. Lembro de ser mais quietinha, de apanhar das outras crianças. Lembro que alguém me disse que os filmes não eram feitos na seqüência, que filmava um plano, depois outro plano e depois juntava os pedaços. Lembro de ficar dias encanada com aquilo…como é que cola depois? Não pode ser. Então eu decidi que a pessoa que me falou era mal informada, resolvi que não era verdade. Como que podia juntar tudo depois?”
Não tire conclusões apressadas, não foi a partir desse questionamento que ela foi tomada pela magia da sétima arte, esse é apenas um exemplo de como estava imersa nas conversas e na vivência com as artes e seus artistas. Manguinhos estava repleto deles e Virgínia se encantava por todas as formas de expressão, “Eu brinco que esse negócio de fazer cinema é porque eu sou artista frustrada né?! (risos) Artista porque eu queria ser música, não fui; queria ser pintora, não fui; queria ser atriz, (risos) não fui. Como não sei desenhar, sou cantora mediana e não sou atriz, então eu fui dirigir, descobri que podia contratar todo mundo pra fazer e ficar na criação, na coordenação da parada (risos)”.
A brincadeira vale, mas, falando sério, “o cinema vem muito daí na minha vida, porque o cinema eu acho que é um lugar onde dá pra confluir tudo, é essa brincadeira de você poder brincar de todas as artes. O que eu consideraria a minha arte é essa coisa da harmonia, do ritmo, que sempre foi uma coisa que me encantou em todas as artes”. Essa brincadeira exige talento, ela sabe. E Virgínia tem talento. Talento e sensibilidade pra perceber o que está a sua volta e isso vem sendo delineado em sua personalidade desde a infância. Uma vez, quando tinha 7 anos, foi reclamar direto com a coordenadora da escola sobre algo que tinha acontecido fora da sala de aula. A professora soube e colocou a menina de castigo, afinal, ela queria ter sido a primeira a saber. A análise da Virgínia foi a seguinte: “deixa pra lá, ela tá só preocupada em manter o poderzinho dela”. Coisas de quem está com os olhos bem abertos.
Elipse! (não dá pra resistir a elipse ao falar de uma cineasta). À parte de ter uma infância “mais voltada pro sonho” - como ela mesma define - e cinema ser sonho impresso em material sensível (olha como são as coisas, a película usada na filmagem é chamada de material sensível), o gosto pelas artes também determinou ou, ao menos, contribuiu muito para que Virgínia estivesse hoje fazendo cinema. Então, vamos falar de cinema. Elipse da infância pro início da juventude.
Corte seco, próxima seqüência.
Quem morava em Vitória no fim dos anos 90 e estava envolvido com vídeo, jornalismo, publicidade, curiosidades e áreas afins, deve se lembrar de um curso promovido pela Secretaria de Estado da Cultura, o “Filme Escola Labirintos Móveis”, que produziu uma película de mesmo nome. Foi lá que muita gente que despontou num novo cenário cinematográfico da ilha se encontrou: Virgínia Jorge, Erly Vieira Jr, Lizandro Nunes, Úrsula Dart, Alessandra Toledo, entre outros. O curso foi um marco pra muita gente. Dali alguns saíram buscando seus caminhos nas áreas de direção, fotografia, roteiro, produção, som, enfim, a primeira dose da cachaça chamada cinema tinha sido tomada.
Houve então uma renovação no cinema capixaba. Depois dessa primeira dose, já não dava mais pra viver sem a fita crepe, o saco de areia e a 3T (pergunte a quem faz cinema sobre a importância desses 3 itens num set de filmagem). “Por isso que as pessoas dizem que é cachaça, porque depois que você passa, escolhe aquela vida com todas as atribulações, é cachaça mesmo. É viciante, é uma endorfina que jogam no sangue da gente, uma plenitude do sonho mesmo”.
O caminho foi sendo trilhado e, logo depois, em outro filme escola, Vivi (usemos o apelido, já sabemos até histórias de infância) percebeu que era como diretora que queria estar no set, “Pra mim foi muito marcante a primeira vez que eu disse ‘Ação!‘ Era um filme escola, ‘O Enforcado’, que foi a primeira vez onde eu arvorei querer ser diretora, porque até então eu queria fotografia. O (filme) “Labirintos” já tinha me marcado com isso. A gente dizia ‘Ação!’ e aquele trem todo começava a se desenrolar na nossa frente. Aquilo menina… olha, até hoje quando eu falo, me emociono. Eu me senti inteira arrepiar e foi de um negócio, de uma felicidade, coisa do sonho mesmo. É assim que eu me sinto quando eu tô no set, que eu posso fazer tudo. Eu digo ação, eu digo corta, as coisas começam e param, é como você ser Deus. Um trem doido de lindo”.
Com tanta adrenalina na veia e já dependente, só lhe restou seguir. Sua filmografia ainda não é extensa, ela é nova, mas como resistir aos sets de filmagem? Vieram então os filmes ‘De Amor e Bactérias’ que roteirizou e dirigiu; “Macabéia” de Erly Vieira Jr, onde dividiu a direção com Erly e Lizandro Nunes; vários curtas e longas produzidos em Vitória e no Rio, cidade onde atuou em diferentes funções, entre elas: “O Resto É Silêncio” de Paulo Halm”(1ª assistência de direção e casting) e no longa “2 Perdidos numa Noite Suja”, de José Jofilly (2ª assistência de direção), entre muitos outros.
Depois de muito ‘ação’ e ‘corta’, Virgínia escreveu e dirigiu “No Princípio Era o Verbo”, o filme que a projetou e foi premiado em grandes festivais brasileiros e, até mesmo, fora de terras tupiniquins.
Mas antes de falar do ‘Verbo’, vale aqui uma pausa: para fazer casting e assistência de direção no curta-metragem “O Resto é Silêncio”, de Paulo Halm, Virgínia aprendeu a linguagem de sinais para se comunicar com os atores surdos/mudos. Já em “No Princípio era o Verbo”, o roteiro foi ‘traduzido’ para braile, já que os atores Fábio Mattos e Darcy do Espírito Santo - que compunham o casting - eram cegos.
Ok, a pausa foi acionada para ilustrar a dedicação da Vivi aos projetos em que ela mergulha. Voltemos então ao ‘Verbo’.
O filme teve 13 prêmios, entre eles “Melhor Curta-metragem em 35mm” segundo a crítica no 8º Festival Internacional de Curtas de BH; “Prêmio Especial do Júri”, “Melhor Roteiro” e “Prêmio Aquisição Canal Brasil”, no 34º Festival de Cinema de Gramado; “Melhor Direção de curta-metragem” e “Melhor Filme de curta-metragem” no 11º Festival Brasileiro de Cinema de Miami e o “Grande prêmio vencedor” do 1º AXN Film Festival, onde concorreu com produções latino-americanas.
Leia na legenda que entre os jurados do festival AXN, estavam Guillermo Arriaga, roteirista de “21 Gramas”, “Amores Perros” e “Babel”, além de Fernando Meireles, de “Cidade de Deus”, entre outros.
Reconhecimento é bom. Quem não gosta?
Mas, sem deslumbramentos, os prêmios foram o reconhecimento a um trabalho que exigiu quatro anos de dedicação, num caminho nem sempre plano. Afinal, glamour só existe depois do filme pronto e no escurinho do cinema, “É um negócio muito caro, muito complicado e foi muito penoso pra mim, porque foi muito longo. Eu fiquei muito tempo sem saber como eu ia terminar o filme (por falta de dinheiro). Filmei em março de 2003 e fui finalizar em agosto de 2005, e eu escrevi em 2001. Então quando eu tava pra terminar o ‘Verbo’, realmente eu dizia que se fizesse de novo é porque eu tava doida e que me internassem. Mas aí o “Verbo” foi muito bem aceito, e eu não tive mais como. Eu vi que não sabia fazer mais nada e aquilo que eu sabia fazer, é difícil, é penoso, mas a gente tem que lidar com o que a gente tem e procurar a via mais serena, mais poética, mais tranqüila de lidar com isso”.
Com a sessão iniciada, onde podemos reconhecer Virgínia Jorge em seus filmes?
Pra começar, é preciso falar de suas referências: Buñuel, Lars Von Trier, Kusturica (esse último a mais forte das influências), “eu queria ser tão boa quanto ele porque ele consegue falar do país dele, das coisas dele. Ele consegue ser metafórico e humano”. Virgínia também quer falar das coisas do Brasil.
Depois de fitar sua obra (a da Virgínia), eu me arriscaria a fazer uma analogia, não com um diretor e sua obra, mas entre Vivi e uma personagem: a de Audrey Tautou em “Amélie Poulain”. As duas estão atentas e dispostas a perceber o que tem de poesia no atropelo do dia a dia, como quando Amélie olha pras nuvens e adivinha o formato de cada uma, sob sua ótica, é claro.
“Eu acho que até agora, no meu cinema, me interessa falar disso, falar do sonho, falar do pequenininho”.
E são várias pequenas coisas que Virgínia vê ou ouve e busca a essência pra então colar, uma após a outra, em seus filmes, dando sentido próprio aos retalhos recortados por olhos e ouvidos, “Normalmente o que me move são as cenas, as pequeninas coisas que eu quero falar do que vi. Geralmente os meus filmes são sobre alguma coisa que vi, que li, ou de uma conversa que pesquei na esquina. ‘De Amor e Bactérias’ tem isso, a idéia principal vem de um conto do Camus. Uma cena que é da velha quando jovem, vem de um conto do Murilo Rubião, e a frase final é do Sartre. ‘No Princípio Era o Verbo’ também, o menino na caixa eu vi na rua, a conversa da roda eu ouvi o comecinho dela às 7 da manhã numa banca de jornal. Essas coisinhas me marcam muito”.
Assim Vivi vai tecendo suas histórias, percebendo o mundo real a sua volta e colocando tudo num mundo de sonhos, reajeitando as pequenas coisas. Segue também arquivando os causos e, como boa contadora deles, vai aumentando os pontos, é claro, “O ‘Verbo’ é isso, um monte de gente inventando, criando as explicações mais esdrúxulas, mas são as explicações deles, que eles acreditam. E isso pode ser uma tragédia, dependendo das circunstâncias, mas no caso especificamente do Brasil, eu acho que a gente cria as coisas de maneira tão diletante, tão infame, tão despretensiosa, tão absurda, tão deliciosa, que é assim: eu tô num botequim e o cara sabe mais que eu e eu não vou deixar ele com essa empáfia toda, saber mais que eu. E cria-se toda uma cultura popular tão vigorosa que sempre me encantou profundamente. A gente é contador de histórias”.
Inclusive, pra fazer essa matéria, ela me contou várias.
Na prática, a teoria deu certo. Tanta observação do cotidiano aliada a ritmo e noção de conjunto, impressos em material sensível, lhe rendeu os seguintes comentários de dois importantes cineastas latino-americanos, do corpo de jurados do 1° AXN Film Festival:
“Son de esas historias que te abren la retina… mis poros se abrieron y empezaron a tragar más emociones, más ideas“. (Claudia Llosa/Peru)
“No sabemos si sus personajes fueron inventados por el director o estaban allí en el momento que decidió filmar“. (Carlos Oteyza/Venezuela)
A vida segue com seus pequenos momentos aos olhos de quem está disponível para vê-los.
Flashback.
A essa altura você já deve (acho eu) ter se perguntado se não vou falar nada sobre a Virgínia Jorge vestida de Frida Kahlo na capa desta revista. Acontece que além da notada semelhança com a pintora mexicana - como você pode perceber - reconhecida principalmente pelas largas sobrancelhas que se juntam sobre os grandes olhos, há outras semelhanças, nem tão aparentes.
Aqui a gente para tudo, flashback, adolescência: quando Vivi tinha 11 anos se matriculou na yoga. Chegou de lá com um bilhete alertando sobre um problema na coluna. Aproximadamente dois anos, diagnósticos e colete depois, passou por uma cirurgia no Hospital Sara Kubitschek, em Brasília. Ela tinha mais de 60° de escoliose, e a cirurgia (artrodese) consistia em algo como soldar um certo número de vértebras de modo a corrigir parcialmente o desvio e impedir que ele aumentasse. Para isso, implantam hastes na coluna, fazem enxertos com tecido e envolvem tudo com musculatura (leigamente falando, por favor). Passou pela cirurgia e pela recuperação sem traumas. Um ano de colete antes da cirurgia, seis meses de gesso depois cirurgia. A vida segue.
E afinal de contas, sua paixão nunca passou pelos esportes, preferia se encantar com a sonoridade das palavras. Quando as aulas estavam chatas fazia listas de proparoxítonas com o amigo Rodrigo Linhales, “Peripatético, lívido, cálido, estereótipo. A gente ficava horas fazendo lista de proparoxítona, que são as palavras mais bonitas, né?!” Fala rindo, dando força a cada uma delas.
A semelhança com Frida (a que está no rosto) foi percebida pela 1ª vez num festival de cinema na Europa. Um homem se aproximou no meio de um bar e disse: - “te conheço. Olhei pra cara dele e falei, desculpe, mas eu não te conheço. Ele falou: mas eu te conheço. Aí brincamos com aquela situação toda. Então ele olhou pra minha cara de novo e lembrou, apontou pra mim e disse - Frida Kahlo!” No dia seguinte, Virgínia ganhava de presente do então marido, o roteirista de cinema Paulo Halm, um livro sobre a pintora mexicana. Começava a reconhecer ali semelhanças que iam além da aparência, “abri numa página a esmo, quando vi, era o auto-retrato dela com a haste num lugar muito parecido com o meu, e a haste, como ela desenhou, era muito parecida com a minha. Aí comecei a ler sobre sua vida, de como ela tinha conseguido superar, conseguido viver, na verdade, com essa dor e com o amor por aquele homem mais velho e mais experiente. Na época eu tava casada com o Paulo então isso era uma referência pra mim, o cara que já faz o que ela quer fazer, já é reconhecido por isso, esse amor dos dois, então me senti muito próxima e comecei a pesquisar mais da vida dela, da obra e fiquei absolutamente encantadíssima, orgulhosa de me parecer com ela, nessa coisa do físico, mas também nesse amor pela arte, pelos bichos, pelas flores, pelas cores, esse universo todo que é tão bonito”.
Dizem que as dores começam aos 30, coincidência ou não, foi por aí que elas começaram a dar sinal, mais fortemente, para Virgínia, talvez por ter entrado num processo muito intenso de escrita, ficando horas na mesma posição. O corpo gritou. Vivi fez mestrado na Universidade Federal da Bahia com ênfase em Análise Fílmica. Foi a quarta vez que saiu do Estado pra morar em outro lugar. O resultado foi uma dissertação com mais de 200 páginas. E muita dor. Sua tese era sobre melodrama, sintomático não? Mas, talvez, onde ela mais se assemelhe a Frida, seja na superação, na capacidade de, mesmo na dor do corpo e na incoerência do mundo, transcender, “Eu acho que talvez uma coisa que mais me aproximaria da arte dela, mais do que essa coisa do visual, é essa coisa de querer falar do sonho num mundo que não privilegia mais isso. Falar do devaneio, do inventado, criado, transformar a vida numa coisa mais doce, mais amena, mesmo com toda a doideira que a gente vive”.
No calor de Salvador, escrevia com uma espécie de lençol térmico envolvendo as costas para aliviar as dores, nesta época ela também finalizava o filme “No Princípio Era o Verbo”. Apesar das dores, terminou o que tinha começado, “Quando as dores começaram a vir, como eu sou (risos) mais ou menos atéia… a gente vai ficando frágil, vai ficando crente (risos), é uma coisa muito feia, mas você perdoa porque é do ser humano. Aí, como vieram as dores e eu nunca tive crenças, meu sistema de crenças era vazio, eu não sou nem batizada nem nada, ela (Frida) meio que virou minha santinha mesmo, quando eu sentia muito aperto eu pedia a ela, botava a fotinho - por isso que tem tanta foto de Frida pela minha casa - botava a fotinho e pensava: ela agüentou, eu vou agüentar”. Agüentou. Mais que isso, sacudiu a poeira e deu a volta por cima, está cheia de novos projetos e outras histórias pra contar.
Adiantando pro futuro, são vários os planos. Um roteiro de longa está entre eles, o argumento já está sendo trabalhado e ela pretende viabilizar que outro diretor filme, “ser diretora de um longa, neste momento, não é uma prioridade”. Prefere, por enquanto, roteirizar e dirigir mais curtas. Outro projeto: a direção de um monólogo teatral que foi adaptado pela atriz Fabíola Buzim a partir de um conto de Ivan Ângelo, “A Menina”. O convite feito por Fabíola, que também atuará na peça, veio depois de Virgínia ter trabalhado, em 2007, como assistente de direção e preparadora de atores na peça teatral “Um Forte Cheiro a Maçã”, dirigido por Luis Tadeu Teixeira. Nesse monólogo, “A Menina”, ela faz uma das coisas que mais gosta, a preparação do ator, “trabalho de ator é um negócio que me encanta, a primeira vez que eu vi um ator chorar eu chorei tanto… acho tão bonito o jeito que aquilo os toma… e depois isso se repetiu muitas vezes, de ver um ator rir e rir, de ver um ator chorar e chorar, tanto no cinema em si - que aí é a força da imagem né - mas no set também”.
Para o set Virgínia vai voltar em breve. Seu roteiro, “Dia de Sol”, foi escolhido no 9°concurso de roteiro capixaba do 14° Vitória Cine Vídeo, em 2007 e ela pretende filmá-lo no primeiro semestre deste ano.
Dessa vez a produção será diferente, menos complicada. “Dia de Sol”, tem 1/3 do tempo de ‘No Princípio Era o Verbo’, a equipe também será super reduzida e o filme, rodado em vídeo pra depois ser transferido pra 35mm. Decisões de quem já sabe onde está se metendo. A história permanece no campo das pequenas coisas do cotidiano, “reduzi tudo, mas as histórias continuam as mesmas. Eu tentei fugir disso dessa vez, mas como fugir de si né?(…) Eu acho que eu quero discutir um pouco, sempre no reino da alegoria, da metáfora, quase que indo pro realismo fantástico, essa relação do homem com seu meio. A gente sempre vai pegar o que tá mais próximo da gente, o que temos à disposição no ambiente em que fomos criados pra resolver nossos conflitos, nossos desejos, nossos anseios, os problemas que pintam. É a tua vida que te dá isso. É uma metáfora bem clara, a gente lida com o que a gente tem e a gente pode lidar com isso poeticamente ou pode lidar duramente. Ele (o personagem principal da história) escolhe a forma poética”. Ao que tudo indica, Virgínia também.
Cortes/ montagem
Pra começo ou fim de conversa, tenho que dizer que durante boa parte do papo que gerou essa matéria, Virgínia estava vestida exatamente como você vê na foto. Testes de figurino entre goles de café e cigarros. Nesse dia, interrompemos a conversa porque ela tinha hora marcada pra pegar o Nego - gato preto que trouxe da Bahia - no veterinário. Depois continuamos, com ela vestida dela mesma.
Mas, sabe o que é interessante nessa história toda? Essa é uma radiografia de um momento, de algumas conversas e é também uma edição de tudo que foi dito. Falar da Vivi é falar de contrastes. Mas o próprio nome, Virgínia Jorge, já sugere que eles existem e, saiba, vêm pra somar. Às vezes, também, pra confundir. O corpo é frágil, a personalidade é forte. A mesma voz que quase some e te obriga a fazer leitura labial durante uma conversa mais longa, imita o poderoso Tim Maia. É… a voz é mansa e grave, mas quando ela vem com vontade, vem que nem um furacão. Vem afinada, diga-se de passagem. E as tais histórias em que ela tanto presta atenção não foram ouvidas apenas na padaria ou no jornaleiro, mas também nos melhores botecos da cidade, sendo Virgínia uma boêmia convicta e com gosto.
Hoje mesmo, pra ler este perfil você poderia ter escolhido a voz rasgada da costa riquenha/mexicana Chavela Vargas ou o rock inglês do Arctic Monkeys. Tudo é Vivi. E muito mais. Ainda bem.
Mas se você preferir, faça como Chico e cante: “ela faz cinema, ela faz cinema…”
Fim.
Janaína SerraJornalista e radialista…………………………….
Bônus
Uma das histórias da Virgínia.
O filme era o “Macabéia” e, como acontece em quase todas as vezes durante uma filmagem, alguém parou pra perguntar o que era aquilo e tal. Ela foi respondendo, o diálogo deu-se mais ou menos assim:
- Que que é isso?
- É um filme.
- Que filme?
- Um curta-metragem, um filme pequeno.
- Pra quê?
- Como pra quê, pra passar.
- Passar aonde?
A Vivi saiu e foi pro set. Depois, em algum momento, foi pro computador e escreveu a seguinte resposta:
PRA QUÊ CINEMA?(Virgínia Jorge)
Pra você ver o que eu viPra você ver o quer,Pra se ver várias vezes,Pra se ver o que nunca se viu,
Pra ficar no escuroPra não estar mais na terraPra não ser mais palavraPra chorar escondido
Pra sermos muitos homens e uma tela
Pra gravar silêncioPra filmar a sombraPra imprimir a luzPra se ouvir os passos
Pra bater as portas
Pra parar o trânsitoPra juntar gentePra dizer açãoPra perguntar pra quê
Pra falar mal do governoPra falar bem das pessoasPra ficar quietinhoPra fazer libertoPra fazer cativo
Pra mudar tudoPra entender nadaPra tirar do focoPra comer pipocaPra conversar no bar
Pra contar estóriaPra entrar pra históriaPra dizer mentiraPra gritar verdadesPra insuflar o povoPra escolher a música
Pra encher de luzPra não se ouvir palavraPra juntar as gentesPra alargar a vida.
A história no set terminou com a tal pessoa falando pra Ana Murta, que também trabalhava no filme:
- É por isso que a agricultura não vai pra frente.

Luiza Lubiana

Prestes a rodar seu mais novo filme, a cineasta capixaba Luiza Lubiana falou sobre o projeto. Com o título de “O Guardião da Aldeia”, o longa-metragem, que será rodado em parceria com a produtora Verve, já tem nomes de peso confirmados no elenco, como Elza Soares e Antônio Abujamra. O locação escolhida foi um dos cartões postais mais belos do Espírito Santo, a formação montanhosa conhecida como O Frade e a Freira, que fica na região de Cachoeiro de Itapemirim.
Para montar o roteiro, a cineasta, que tem filmes premiados no currículo, como “Sacramento” (1991), “A Lenda de Proitinier” (1996) e “Manada” (2005), subverteu uma famosa lenda capixaba que conta a história do Frade e da Freira.
AR - Como surgiu o interesse de filmar essa história?
A história original era sobre o jardim das delicias de Hieronimuns Bosch, mas depois, em uma conversa com o Ziraldo, ele me disse que o Espírito Santo era o ateliê de escultura de Deus, que aqui havia as pedras mais lindas do mundo. E foi aí que deu um click e eu resolvi reinventar a lenda do Frade e a Freira completamente.
AR - O elenco do filme já está definido?
Apenas o elenco principal. Os atores já definidos são; Daniel de Oliveira, Antonio Abujamra, Milena Toscano, Tayana Dantas, Rosi Campos e Christiane Torloni.Além de contarmos com a
AR - Qual a previsão para o início das filmagens e da finalização?
A pire-produção começou em Setembro, o filme tem uma pire demorada, pois construiremos um cenário fixo aos pés da pedra. A previsão é que iniciemos as filmagens em Março de 2009 e lancemos o filme no inicio de 2010.
AR - O Espírito Santo é muito rico em histórias. Mas porque quase nenhuma delas ganha registro cinematográfico?
O espírito Santo tem uma cabeça de burro enterrado quando se trata de cultura. O Governador via Secult (Secretaria de Cultura) lançou um edital agora de R$ 2.000.000, o equivalente ao que a Lei Rubem Braga dá pro Município. E ainda sem a certeza de que vai continuar. Nós, artistas, demos um projeto pro Paulo Hartung (Governador do ES) antes dele se eleger pela primeira vez, pedindo um edital estadual via o ICMS. Ele engavetou o projeto e agora está com essa política medíocre de privatização.
AR - Rodar um longa-metragem por aqui é coisa rara. O que te motiva?
Eu amo o cinema. Sempre digo: fazer cinema é como atravessar um deserto, sem tenda, sem cantil, sem odalisca e sem camelo. O que nos salva são as miragens, a possibilidade de transformar quimeras em realidades fílmicas.
AR - Como você vê o cinema capixaba hoje?
Em termos de curta metragem está crescendo consideravelmente. Em 94 só foi feito o meu filme, “A lenda de Proitnier”, em 16mm e mais um outro, e ficou bastante tempo sem mais de uma produção por ano. Agora a galera aposta em vídeo, que é mais barato e tem tido bons resultados. Mas gente boa mesmo em cinema eu acredito em uns 03 diretores apenas.
AR- Sobre os atores capixabas, eles terão chance em seu filme?
Claro que sim. Mais próximo a data de filmagem abrirei testes e pretendo dar a oportunidade para muitos deles, pois acredito no potencial artístico da nossa terra. No elenco principal já conto com a jovem atriz Tayana Dantas que é da terrinha, ela além de fazer o longa também é a protagonista do meu novo curta-metragem “Milagre”, acredito muito no trabalho dela e tenho certeza de que será um grande nome muito em breve, pois é de um carisma e uma sensibilidade cênica emocionante, além de ter uma garra pouco comum a nós artistas.

Eryk Rocha

Rocha que Voa opera com a limpeza da fala de Glauber e um discurso visual nítido, propositadamente embaçado. Como você chegou a este formato?
Eryk Rocha - As gravações das entrevistas de Glauber à rádio cubana só foram inseridas no filme depois da montagem, no Rio. No início, a idéia era fazer um filme biográfico, anedótico, realista, ligado ao cinema-verdade. Felizmente, isto não ocorreu. O novo formato apareceu em meu retorno ao Brasil, depois de seis anos entre Venezuela, Colômbia e Cuba. Percebi o abismo do Brasil em relação ao continente, e vice-versa. O filme funciona como um grão de arroz na tentativa de reconstruir o diálogo latino-americano. Fizemos o que queríamos com a linguagem do filme. Não concedemos.
Em Rocha que Voa você busca a imagem de seu pai, mas não só. Glauber contestou o cinema tradicional e você condena a tendência de filmar a partir de padrões americanos e televisivos.
Rocha - Rocha que Voa veio para desorganizar, para abrir um debate estético e cultural sobre o papel do cinema. É uma busca pelo pai, mas também pelo país, por minha identidade latino-americana. Murilo Mendes diz que a memória é uma construção do futuro, e o filme caminha nesta direção. Há nele a memória particular, do meu pai, a coletiva, do continente latino-americano, e a cinematográfica, do Cinema Novo, uma referência importante com a qual temos de dialogar. Na montagem do filme e na montagem interna dos planos, há uma sobreposição de memórias. O filme traz a imagem concreta, de arquivo, dos anos 60, e a abstrata, imprecisa, que é minha, porque eu não vivi aquela época. Perdeu-se no cinema o olhar do autor, que potencializa o conteúdo do filme. Rocha que Voa é um trabalho pessoal.
Seu filme sugere que a fala de Glauber, de 30 anos, vale hoje. A integração latino-americana, como ele pregava, não ocorreu. E o cinema, como linguagem, abraçou a popularização que o empobrece.
Rocha - Preocupado em conquistar o grande público, o cinema se aproximou demais da linguagem da televisão. Os atores viraram globais - eles são "marcas" para que o filme tenha público e capte dinheiro. Mas eu acredito no cinema como um espaço sagrado de reflexão, uma atividade que não pode se banalizar, um patrimônio público. Não devemos fazer o que a televisão faz, porque ela é um outro meio, tem um outro valor. Muitos dos filmes feitos hoje são televisões ampliadas. O problema não é o cinema comercial, ele sempre vai existir e é importante para a indústria. O problema é a ausência de espaços para o cinema experimental. Hélio Oiticica dizia, num texto que parece escrito hoje, que "experimental" é a condição do Brasil. Atualmente há uma quantidade de filmes bem acabados, de excelente patamar técnico, com os quais nós não podemos nos contentar. Sem conflito, sem debate, o cinema não evolui. Buscar este debate é o desafio da minha geração.
Quem faz cinema experimental no Brasil?
Rocha - Poucos. O Sertão das Memórias, ficção de José Araújo, é um filme belíssimo neste sentido, assim como O Fim do Sem Fim, documentário de Lucas Bambozzi, Belo Magalhães e Cao Guimarães, longa em 35mm que nem chegou ao circuito. Lavoura Arcaica, de Luiz Fernando Carvalho, é audaz. O Invasor, de Beto Brant, concilia o modelo clássico de narrativa com uma história ágil, contemporânea - e desloca o bandido do gueto, enquanto há um subcinema, uma subvertente dentro do cinema hegemônico, que se glorifica estetizando a miséria e a pobreza, promovendo um exotismo da violência (não vou citar um filme em particular). O cinema-verdade, tanto no documentário quanto na ficção, é hegemônico, representa o pensamento único da globalização. Dizem que o cinema autoral, de pensamento, não dá público. É mentira. O público não vê este cinema porque ele não chega até o público. O Brasil é um país diverso e precisa ter uma diversidade de filmes.
Miguel Vasilskis - É assustador ver como o cinema vai ficando padronizado no país. Os diretores acham que, apostando na linguagem comercial, vão conseguir um mercado. O mercado no Brasil não existe ou é insignificante em relação ao número de habitantes. O Brasil é o império da Rede Globo e das televisões. Ir para o mercado externo também não dá: das dez obras filmadas no mundo, nove ficam no armário. Se é para fazer o que é feito melhor em outros países, nós sempre vamos ficar para trás.
Ao retornar de Havana, como você percebeu as diferenças entre o que se produz lá e aqui?
Rocha - Cuba chegou a produzir 15 filmes por ano. Hoje, depois da queda do bloco do campo socialista, são dois, ainda assim em co-produção com a Espanha. Os cubanos discutem cinema, e fazem isto em meu filme, porque têm uma tradição cinematográfica rica. No Brasil, pelo contrário, a produção cinematográfica se tornou grande, mas mecânica. Filma-se de forma compulsiva, sem se perguntar por quê.
Este embaçamento utilizado como recurso visual no filme não parece ser algo tão estranho assim. Mesmo a MTV exibe videoclips em que a imagem do cantor aparece desfocada em primeiro plano. Vocês identificam um movimento de absorção de suas idéias?
Vasilskis - O processo de criação visual do filme partiu de uma idéia do Eryk, de tornar a imagem do ano 2000 semelhante à dos anos 60. Entrou aí o uso da película em preto e branco granulada, já com o fungo incluído no nosso filme, vencido. Esta foi a maneira que encontramos para transpor a idéia de Eryk, mas, também, o recurso que tínhamos para trabalhar. A melhor maneira de anular um movimento não é combatê-lo, é absorvê-lo. A plástica sem sentido é só a plástica, é a cosmética das idéias.
Rocha - Nós incorporamos as limitações técnicas, os acasos, ao filme. Nossa película em preto e branco é vencida. Mas a grande pergunta que o filme suscita é: estas idéias estão vencidas? Há desfocados e desfocados. A técnica desfocada, abstrata, de Rocha que Voa, funda-se num projeto estético, de modo a potencializar o assunto do filme. Trabalhamos com tudo, 16mm, betacam, high-8, digital, material de arquivo em 35mm telecinado. Não cremos no diretorzinho que vem com monitorzinho para filmar. O documentário pede um cineasta do corpo. Tem de sentir a parada lá. Fizemos um roteiro de 50 situações e nos propusemos o ritual de filmar as seqüências, porque os cineastas estavam morrendo, como todos morrem, a arquitetura ruía, a cidade de Havana estava acabando.
Quais são os seus novos projetos?
Vou trabalhar sobre a obra da documentarista cubana Sara Gómez no ano que vem. Mas, na próxima semana, iniciamos no Rio um documentário sobre o imaginário político brasileiro. Entendemos o Rio como o Brasil porque a cidade tem esta tradição de antiga capital federal e porque ela é o que os recursos nos possibilitam. A idéia é fazer um contraponto à visão oficial dos candidatos à presidência. Não vamos entrevistá-los. O filme vai partir do pressuposto de que o Brasil percebe a necessidade de mudança e, ao mesmo tempo, é indiferente diante da mudança que a política oferecerá. Faremos pesquisa formal, poética, estética, em busca da forma visual. Quero continuar trabalhando com texturas, com diferentes qualidades de imagem.